O Professor Ricardo Alexandre (2017), ao diferenciar tributo de multa, especifica que esta tem caráter sancionatório, punitivo por ato ilícito e que o ideal é que sua natureza não seja para arrecadação.
É aceitável quando aplicada justamente após algum ato ilícito. E quando não houve este ato?
São incontáveis os depoimentos de pessoas pedindo ajuda em fóruns virtuais a respeito de multas indevidas, e geralmente dizem respeito a: limite de velocidade ultrapassado em avenida X, estando o carro estacionado na residência do indivíduo, ou numa loja, restaurante, ou qualquer outro local que não seja a avenida. E o pior, o autuado muitas vezes consegue provar que nem em movimento o veículo estava!
As histórias dariam um filme! E como me atentei para elas? Justamente porque entrei na posição de autuada, recebendo uma bela multa por "indicar sinal com pouca antecedência" numa avenida que eu passava todos os dias, PORÉM, não naquele horário. E o pior... o carro estava numa pizzaria, ESTACIONADO, longe do local da autuação, no momento do auto de infração! Seria impossível o automóvel estar ali naquela hora.
Você com certeza deve estar se perguntando se recorremos - lógico que sim! - e se o resultado foi favorável. Isto eu deixo pro final.
Até irmos à JARI do município recorrer, conseguimos encontrar o horário do pagamento da pizza na fatura de cartão de crédito, o que foi uma grande sorte! E se tivéssemos pago em dinheiro? Já era.
E até abrir o recurso histórias tristes não faltaram. A que mais me marcou foi sobre um senhor aposentado em Brasília. Seu carro ficava estacionado na garagem de seu condomínio, e assim como nós, recebeu uma multa no horário e local onde o carro não estava. O desfecho não me recordo.
Outro caso foi de uma moça no interior de São Paulo cujo carro estava estacionado na garagem de seu condomínio, porém também recebeu multa. Ela recorreu diversas vezes, anexou fotos do circuito de câmeras e o recurso foi negado repetidamente. E os juros da multa só aumentando.
Demos entrada no recurso, estávamos bastante confiantes, pois havia prova material. Uns 40 dias depois, chega a mesma multa em casa, reajustada e com o recurso NEGADO.
Caímos na estatística virtual que nós mesmos pesquisamos. Perdemos uma manhã na JARI e um balde de água fria, contendo incredulidade, cansaço e indignação pelo Brasil "funcionar" desta forma.
Inclusive, dentro de uma breve pesquisa em artigos que falam sobre a questão das multas indevidas no Brasil, esta é uma das poucas áreas em que o ônus da prova é totalmente do acusado. No Direito Penal, por exemplo, o ônus da prova geralmente é de quem acusa. Ou seja, você pode até chegar e dizer que fulano fez algo, mas terá que provar. No entanto, no que diz respeito ao Direito Administrativo, que é o condizente com as multas de trânsito, há uma prevalência absoluta do princípio da presunção de legitimidade, ou seja, a Administração Pública supõe estar correta em todos os seus atos, agindo de boa-fé, ou seja, na dúvida, o Estado está com a razão.
Alguns estudiosos atribuem, no caso específico da multa, um resquício da ditadura militar, com elementos de autoritarismo e, como foi citado, ônus da prova de fato negativo. Podemos claramente perceber um autoritarismo inadmissível em muitos atos onde o cidadão sai prejudicado, e justamente aquele que honra com seus compromissos, pois percebe-se em situação de impotência e incredulidade no próprio sistema.
É lamentável a falta de resolutividade quanto ao problema de tantas multas indevidas, gerando a péssima crença na indústria da multa, que se torna real quando o indivíduo se vê punido por algo que não cometeu, ainda que prove.
É lamentável a falta de resolutividade quanto ao problema de tantas multas indevidas, gerando a péssima crença na indústria da multa, que se torna real quando o indivíduo se vê punido por algo que não cometeu, ainda que prove.
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